A rivalidade entre Brasil e Argentina não é recente, começou no século 19, quando os dois países se tornaram os mais importantes do Cone Sul. Para o cientista político Rosendo Fraga, as duas nações herdaram a disputa entre Portugal e Espanha, o que, em nossa história, culminou na Guerra Cisplatina (1825 – 1828). Além disso, muitos outros historiadores dizem ser comum no passado que argentinos nos olhassem com ar de superioridade, explicado por eles, pelo processo de colonização que os tornou um país mais igualitário e desenvolvido. Por sua vez, as disputas no campo político e econômico sobreviveram ao tempo, e hoje estão até mais acirradas devido à guinada ideológica para lados opostos que as nações tomaram, mas é no futebol que a desarmonia alcança níveis mais altos, chegamos até se comemorar as derrotas dos nossos “hermanos” como se fossem nossas vitórias.
Por outro lado, se estamos levando a melhor no futebol, com cinco Copas do Mundo conquistados contra apenas duas dos nossos vizinhos, no cinema a coisa se inverte: estamos muito atrás deles. Afinal, o cinema argentino já conquistou o respeito da crítica mundial, chegando inclusive a levar o Oscar de melhor filme estrangeiro por duas vezes: A História Oficial, 1985, de Luiz Puenzo; e O Segredo dos Seus Olhos, 2009, de Juan Jose Campanella.
Enquanto, no Brasil, nossas produções atuais miram em comédias “descartáveis” de humor rasteiro e linguagem novelesca para atender as massas, ou em dramas existenciais que quase ninguém assiste, o cinema argentino prima muito pela qualidade dos roteiros, sendo um grande contador de histórias, e entrega um produto final bem mais refinado e duradouro em nossas memórias. Claro que existem exceções em ambos os lados, pois temos filmes maravilhosos (Cidade de Deus, Central do Brasil, O Auto da Compadecida e tantos outros), e eles “derrapam” vez ou outra.
Nesse sentido, aprendemos a deixar a rivalidade de lado e apreciar as ótimas obras argentinas, principalmente quando estas são estreladas pelo seu maior astro, o ator de 64 anos Ricardo Darín, um verdadeiro ícone da cultura portenha, que até já rejeitou diversos papéis em Hollywood por não concordar com a estereotipização dos atores latinos (muitas vezes interpretando traficantes ou “latin lovers”), nos longas norte-americanos.
Finalmente, uma prova da aceitação aos filmes argentinos ao redor do mundo são suas bilheterias que alcançam números bastante positivos, entre elas estão: Relatos Selvagens, 2014, de Damián Szifron, que rendeu 179 milhões (o longa é dividido em seis histórias de aproximadamente vinte minutos em que os protagonistas são expostos a situações de absoluta pressão emocional); O Anjo, 2019, de Luis Ortega, que conta a história real de Carlos Robledo Puch, um jovem de rosto angelical, muito inteligente, de classe média ( falava três idiomas e tocava piano ), que matou pelo menos 11 pessoas, estuprou mulheres e cometeu mais de 15 roubos; Minha Obra Prima, 2018, de Gastón Duprat, na trama, um vendedor de obras de arte tenta recuperar a carreira de um amigo pintor, mas de uma maneira nem um pouco convencional. Trata-se de uma comédia muito bem escrita e interpretada por dois ótimos atores (Guillermo Francella e Luis Brandoni ), que faz uma excelente crítica à arte contemporânea, muitas vezes enaltecida sem qualquer critério.
Filmes argentinos fáceis de encontrar:
Medianeras – Globo Play
O Segredo do Seus Olhos – Amazon Prime
Nove Rainhas – Amazon Prime
Relatos Selvagens – Telecine
A Odisseia dos Tontos – Telecine
Um Cidadão Ilustre – Netflix
Minha Obra Prima – Netflix
Truman – Now Net
A História Oficial – Netflix
O Que os Homens Falam – Amazon Prime
O Mesmo Amor, A Mesma Chuva
Sobre o autor da coluna
Michel Abrahão é um cinéfilo paulista, radicado na Paraíba, proprietário da antiga e querida Ribalta Vídeo, referência para todos os moradores de João Pessoa também apaixonados por cinema.